Gotas pesadas caiam sobre o telhado. Aqui e ali era possível notar goteiras que penetravam pelas rachaduras nas telhas e eram recebidas por baldes e panelas, dispostas estrategicamente sob os locais conhecidos de vazamento. Na região periférica de Iwagakure, longe de todo o glamour e agitação do centro urbano, onde figuras famosas desfilavam pelas ruas seja para frequentar os centros comerciais, seja para visitar os prédios do Governo, ficava a pequena, modesta e (sendo muito sincera) caindo aos pedaços, casa de Shinzo. A estrutura de pouquíssimos metros quadrados tinha espaço apenas para uma sala compartilhada com cozinha, um quarto pequeno e um banheiro menor ainda – o tipo de casa que normalmente era mantido por órfãos de guerra que perderam seus país muito cedo para terem a própria carreira, e muito tarde para serem adotados por alguém.  É claro que, no caso da jovem garota, fora ela a autora de ambas as mortes. Seu pai foi preso por uma denúncia feita por ela mesma, e muitos anos depois assassinado a seu comando; já a mãe, ela a matou durante o parto, ou pelo menos era o que seu pai sempre lhe dissera. De todo modo, estava sozinha desde que ingressou na Academia e mesmo economizando o máximo que podia o dinheiro não tardou a se esvair.

Um trovão rasgou os céus carmesins, iluminando o interior da sala. Ao longe, uma matilha de cães começou a latir em resposta ao rugido celeste. Aquela noite deveria ser um dos últimos dias de seu treino para dominar a Liberação de Eletricidade, então a ruiva interpretava, com aparente ironia interna, a tempestade como um sinal positivo mandado pelos deuses, quase um encorajamento – uma piada, já que não acreditava nos deuses. Cobrindo à mesa à sua frente estavam diversos rolos de pergaminho estendidos, alguns pendendo para o chão, assim como livros e mais livros abertos em páginas com marcadores coloridos. Em todos era possível ver textos e figuras demonstrativas ensinando a realizar os selos de mão que tinham relação com a Liberação de Eletricidade, a maneira correta de fluir o chakra dentro de si e moldá-lo através de seu controle. Dominar uma segunda natureza aquém de sua afinidade não era uma tarefa simples, algo que todos sabiam muito bem, principalmente para uma kunoichi de nível Genin; mas aquela kunoichi, em especial, por toda sua vida havia se diferenciado dos demais. Nascera com uma enorme habilidade não só para controlar sua própria rede de chakra, como também mostrou-se proficiente na dominação de Genjutsu's, a maior especialidade de seu Clã, e Ninjutsu's, destacando-se pela facilidade que tinham em versar as técnicas que lhe eram ensinadas. Empenho, força de vontade e dedicação inabalável, uma mente sempre focada em um único objetivo no horizonte distante. Para chegar lá não havia espaço para a falha, para o fracasso ou a incapacidade – se ela queria então ela podia, e se ela podia então ela conseguia. Sempre foi assim, e para sempre assim será.

Pela milionésima vez naquelas semanas repetiu os selos do Boi, Coelho e Macaco, que tinham uma relação mais íntima com o Raiton, assim como algumas fórmulas e conjuntos mais complexos contidos nos livros. Ainda não fora capaz de dominar por completo nenhum jutsu contido nos pergaminhos, mas a cada nova tentativa sentia progresso em agitar o chakra dentro de si, fazer com que as moléculas vibrassem em ritmo constante, e cada vez mais sentia a eletricidade fluindo por dentro de seu corpo e saindo para fora em pequenas faíscas. No décimo terceiro dia, também conhecido como hoje, conforme a tempestade do lado de fora se acalmava a ruiva também deixava as batidas de seu coração arrefecerem. Quando se deixou largar sob a cadeira, secando o suor frio da testa, o sorriso vitorioso brincava em seus lábios.
Sim, havia conseguido.

Considerações: