Hattori Shion

 
Enquanto o reino se agitava com os preparativos para a coroação e as investigações policiais capturavam a atenção pública, Angell concedia a si mesma um merecido descanso, afastando-se temporariamente dos holofotes e das responsabilidades. Nesse ínterim, Shion, movido por motivos pessoais velados sob a rotina de obrigações reais, planejava uma visita singular, distante dos olhos curiosos de sua família e do reino.

Alegando ter compromissos burocráticos no centro, uma desculpa hábil para escapar das perguntas inquisidoras de seus filhos, Shion encarregava-os de tarefas inventadas, garantindo assim a solidão necessária para sua jornada. A verdadeira natureza de seu afazer era uma visita a uma velha "amiga", um elo do passado que o chamava em meio à turbulência de seus dias atuais.

O hospital, um lugar de cura e de memórias, havia se tornado, nos últimos dias, cenário para um acampamento de repórteres e paparazzis, todos à espreita por um vislumbre de Angell, a heroína do torneio. Porém, naquela manhã, a chegada de um veículo luxuoso, com vidros tão escuros quanto os mistérios que Shion pretendia manter, desencadeava um frenesi entre os jornalistas, prontos para capturar qualquer sombra da nobreza Hattori. Contrariando as expectativas, era Shion quem emergia do carro, a presença real impondo um silêncio respeitoso, pontuado apenas por murmúrios de surpresa e especulação.

Seu pedido aos seguranças, sussurrado com a autoridade de quem está acostumado a ser obedecido, deixava claro seu desejo de privacidade: "Verifica se tem alguma foto minha ou se alguém está escrevendo algo sobre mim hoje, apague qualquer evidência da minha visita." A discrição era sua armadura naquele dia, protegendo não apenas a si mesmo, mas também a pessoa que estava prestes a visitar.

Adentrando o hospital, Shion era recebido com o calor da admiração, cada cumprimento e sorriso dos funcionários tecendo elogios à coragem e ao talento de Angell. No entanto, sua mente estava focada em um propósito mais íntimo, um reencontro que desejava que fosse tão privado quanto significativo. Declinando cortesmente a companhia oferecida, ele expressava o desejo de caminhar sozinho pelas instalações, seus passos guiados não por um interesse em avaliações administrativas, mas por um chamado do coração.

Os seguranças, eficientes e discretos, garantiam que nenhum curioso pudesse seguir ou interromper a jornada solitária de Shion. Era um momento raro de reflexão para o rei, um respiro na incessante maratona de deveres e decisões que compunham seu dia a dia.

precedia a entrada secreta para a ala oculta, um caminho conhecido apenas por aqueles de confiança inabalável. Certificando-se da ausência de olhares curiosos, ele manobrava a passagem secreta, adentrando um espaço onde o tempo e as preocupações do mundo exterior pareciam suspensos. Os funcionários, cuja lealdade era garantida tanto pela generosidade de Shion quanto pela gravidade de sua missão, recebiam-no com alegria, um testemunho do respeito e do carinho mútuos que transcenderam os anos.

Chegando à porta da única sala que marcava o coração dessa ala oculta, Shion inquiria a enfermeira, sua voz tingida de uma esperança cautelosa: "Como ela tem passado? Algum sinal de melhora?" Através da porta entreaberta, ele observava, enquanto a enfermeira, com uma gentileza que amenizava a dura realidade de suas palavras, respondia: "Ela continua na mesma, não consegue falar, as vezes se irrita, uma vez ela tentou morder aquela moça que o senhor indicou, aquela Hattori, ela foi dar banho nela e ela pareceu se irritar, mas depois a sedamos e enfim ela se acalmou, mas fora isso nenhum outro sinal." Shion, absorvendo a notícia com um misto de resignação e gratidão, agradecia os cuidados dedicados antes de solicitar um momento de privacidade.

No interior do quarto, a penumbra envolvia Shion num manto de introspecção e memória. Com movimentos medidos, ele dispunha seu terno em um cabide, aproximava-se da janela e convidava a luz do dia a preencher o espaço. A reação imediata de Azshara à incursão luminosa, um grunhido de desconforto, era um lembrete pungente da barreira intransponível que se erguia entre eles. Apesar disso, Shion mantinha-se imóvel, um farol de calma e compreensão, até que finalmente rompia o silêncio: "Já faz um bom tempo, em mãe." A aliança em seu dedo, reluzindo sob a luz filtrada, era um símbolo das mudanças e continuidades em sua vida. "Muita coisa aconteceu, eu e Katsura oficialmente nos casamos, sua neta Angell se casou e as coisas têm ficado boas."

Ele se acomodou próximo às pernas dela na cama, absorvendo a luz que invadia o quarto pela janela. Com movimentos delicados, aproximou-se do rosto dela para conferir sua higiene. "Ótimo, seus dentes continuam limpos", observou ele, enquanto desvelava o corpo dela, revelando sua imobilidade. Segurou sua mão com gentileza, apesar da frágil resistência que ela tentava apresentar. Ele emitiu um som suave, uma tentativa de acalmá-la, solicitando silêncio. Com atenção, examinou as unhas dela, inspecionou suas orelhas e finalizou a inspeção. "Ótimo, está tudo nos conformes", concluiu, erguendo-se para observá-la mais uma vez. Apoiou a mão na cintura, circulou a cama em busca de palavras ou reações, e finalmente sentou-se ao lado dela, desta vez à direita.

"Eu e seus netos fizemos algo incrível. E o mais incrível é que todos contribuíram", revelou ele com um sorriso. "Lembra quando você dizia que um dia tudo se tornaria um? Conseguimos. Marcamos uma reunião com todos os reis, organizei tudo cuidadosamente, cadeiras, posições, tudo meticulosamente, exatamente como você me ensinou. Em vinte segundos, derrubamos todos eles. Com os reis caídos, não foi difícil convencer os mais jovens de que o trabalho seria árduo, melhor deixar para alguém mais experiente", disse, apontando maliciosamente para si mesmo, seu sorriso delineando as maquinações de seu plano.

"Mas aquela velha Senju, ela era astuta, sabia que tinha sido eu. Tomei todos os cuidados, até usamos a armadura do Widowmaker, mas desta vez não fui eu. Eu estava na sala, até levei um tiro para desempenhar bem meu papel. Mas foi Hakurei quem fez o serviço sujo. O garoto é bom, esperto, sem medo de puxar o gatilho. E você tentou matá-lo, que erro", disse, afastando-se com um sorriso.

"A velha Senju desconfiou e propôs um Mak’Gora. Ela desafiou Angell, acho que o plano deles era humilhar um Hattori no campo de batalha para tentar enfraquecer nosso nome", continuou, com os punhos cerrados, a irritação evidente em sua voz. "Mas então eu pensei, o que Azshara faria?" Aproximou-se de Azshara, que tentava se afastar, mas era inútil.

"Sim, Azshara faria em dobro. Levei Angell ao velho dojo, treinei-a até que não aguentasse mais. E você, vovó, vai ficar muito orgulhosa da sua neta. Ela venceu sem trapacear. Sim, os Greys ainda continuam invictos no Mag’Gora. Mas olha, eu admito, ver Angell lutando lá trouxe uma intensa nostalgia. Lembro quando eu retalhava os otários lá para você."


Shion se ergueu, desviando o assunto para algo mais urgente. "Entretanto, minha visita, além de trazer-lhe atualizações, carrega um propósito adicional. No meio de todo esse tumulto, vi-me obrigado a prometer a retirada do feitiço que você lançou. E sabemos que, sem o Livro dos Greys, nem mesmo Katsura seria capaz de reverter um encantamento considerado irreversível. Por isso, estou aqui para inquirir sobre um detalhe específico: a biblioteca dos Greys. Assim que percebeu a inevitabilidade da derrota frente ao grande exército, você ordenou que tudo fosse incinerado. Conhecendo seu orgulho, não esperaria menos", comentou, observando um sorriso involuntário surgir nos lábios de Azshara, o qual, por sua vez, provocou um sorriso mordaz em Shion ao se aproximar.

"Um sorriso, isso é ótimo. Mas agora, permita-me fazer uma pergunta, e desejo sua mais sincera resposta: os Greys de outro mundo são, de fato, criação minha, mas você esteve lá, não esteve?" Percebeu a surpresa dela, seus olhos se arregalaram, sua respiração tornou-se ofegante. "Imaginei que sim. E agora, a pergunta que vale um beijo na testa: existe uma cópia de cada escritura Grey na biblioteca sagrada deles, não é? Você não descartaria milênios de conhecimento tão levianamente." Ao ver Azshara desviar o rosto, Shion quase saltou de alegria. "MUITO OBRIGADO!" exclamou, transbordando de euforia. "Você nem imagina o quão útil isso será, não para a trivialidade de remover o outro sujeito, mas para algo muito mais grandioso do que você jamais sonhou. Em sua era, você buscou criar o povo perfeito, mas são as imperfeições que os tornam superiores. Entre os desinteressantes Greys, dois jovens se destacam para mim: Allania e Nathaniel. Eles ainda desconhecem o real potencial de seus poderes, mas acredito que, com o estímulo adequado, deixando pistas e mostrando os caminhos corretos, eles podem se tornar a peça final para algo monumental que estou planejando."

Shion sentou-se ao lado de Azshara, segurou sua mão direita e sussurrou em seu ouvido. "Eu pretendo matar o Celestial." Azshara arregalou os olhos e, após um longo silêncio, soltou uma gargalhada, tossindo e engasgando, mas rindo alto. Irritado com sua reação de deboche, Shion retirou do bolso uma caixa alongada, revelando uma seringa dentro. Mesmo antecipando o que viria a seguir, Azshara continuou rindo. Com a seringa em mãos, ele começou a injetar a substância em sua veia, e conforme a droga era administrada, ela gradativamente perdia a consciência. Ele limpou o local da injeção com um algodão, levantou-se guardando a seringa de volta no bolso e cobriu Azshara, agora completamente sob o efeito da droga. Deixando um beijo em sua testa, ele se preparou para partir, deixando um último comentário: "Eu já disse, eu lhe daria o mundo, se você me desejasse." E assim, partiu.