Ele caminhava taciturnamente como um espectro sombrio na noite nebulosa. Era uma estrada de paralelepípedos e arbustos que ladeavam incontáveis lápides e estátuas ao longo do percurso, num cenário fúnebre com aroma de flores e incensos que serviam como homenagem para pessoas que jamais retornariam do mundo dos mortos. Enquanto calcorreava o cemitério, Aleister desejou que a pequena Yookori estivesse lhe esperando sentada sobre sua lápide, com um sorriso brilhante estampado no rosto e encantada por reencontrar seu pai. Quando finalmente chegou em frente ao túmulo, não havia nenhum fantasma por ali, muito menos um sorriso. Foi como se uma espada de ferro fosse trespassada pelo seu peito impiedosamente. Ela jamais retornaria. Nunca. Do ponto de vista teológico, gozava de felicidade eterna no reino dos céus, mas sempre que pensava naquilo o comandante da Ordem entristecia-se mais e uma dor poderosa acometia-lhe o peito. A dor da culpa, a dor do arrependimento, a dor... tudo o que preenchia o seu coração naquele momento era dor. Saudade, um pouco de apreensão e até mesmo medo contaminavam também a sua alma. Ele era um homem do conhecimento, da lógica e do saber; jamais aceitaria um fim como aquele, tampouco uma resposta tão superficial como a felicidade eterna. Fora pai e jamais deixaria de ser, e um pai jamais desistiria de sua filha, mesmo depois da morte.

—— Muita coisa mudou depois daquele dia, Yoo-chan. O papai conheceu pessoas novas, aliados importantes e de alguma forma conseguiu uma posição muito importante no trabalho, algo que no futuro poderá ser usado para te trazer de volta. Eu sei que você está ai, em algum lugar, mas não fica com medo, ta bom? O papai te ama e vai te buscar, eu prometo. —— Ele sussurrou e levou a mão ao sobretudo, tirando dali um pequeno palito branco entre os dedos. Colocou-o na boca e vasculhou as roupas em busca do cigarro, acendendo-o no processo. Deu uma primeira tragada e sentiu um pouco do prazer que deixara de sentir desde aquele dia.

—— Prometo te levar para tomar sorvete. —— Continuou, com um olhar melancólico. —— Prometo que iremos naquele passeio de canoa que você queria ir—— Mesmo velho e cansado, pequenos cristais líquidos aglomeraram-se em seus olhos, mas ele esfregou-os com o antebraço e permaneceu solene. —— Prometo que serei um pai mais presente, te levarei na escola todos os dias e estarei lá no horário certo para te buscar. Sem atrasos dessa vez, ta bom? Eu... eu prometo. —— Ele tombou, ajoelhando-se em frente ao túmulo com a imagem de uma pequena jovem de cabelos loiros, mas não permitiu-se chorar. Ele não deveria, era inadmissível. Sentiu como se uma espada lhe perfurasse o centro do peito, mas engoliu em seco, limpou o resíduo lacrimal no canto dos olhos e se reergueu. Sua expressão facial estava muito mais deprimente e obscura agora. —— Eu preciso ir, as pessoas precisam do papai, mas prometo voltar em breve. Boa noite, minha filha.

E dando as costas, o homem misterioso desapareceu na escuridão.

Considerações & Regras: