Talvez ele tivesse alguma ideia de onde estava se metendo, mas é difícil dizer com certeza. Como tudo relacionado a Judah; é sempre difícil ter certeza. Mas o que importa é que percorria as ruas da Nuvem com um pequeno sorriso nos lábios, assentindo com a cabeça para os conhecidos que cruzavam seu deturpado caminho. Sabiam que agora o garoto era um ninja formado, e apesar das diversas reprovações na Academia Ninja havia uma certa expectativa sobre a sua primeira missão. E a faria sozinho.

Não recebeu grandes instruções além de uma carta um tanto desaforada de um Chunin que nunca ouviu falar dizendo ”Esteja no Centro de Inteligência às 8h. Sem um segundo a mais”. Junto havia um documento que agora se encontrava nas mãos do Genin, um simples resumo da tarefa. Aparentemente se tratava de um caso de sequestros múltiplos que intrigava os moradores e chamou a atenção das autoridades.

No prédio em questão havia pouquíssimo movimento, provavelmente por conta da hora. Mas logo foi capaz de se informar a respeito de que sala deveria ir, além de mais informações sobre o andamento da tal missão.

— Ela está a sua espera, por favor tenha cuidado com o que vai dizer.

Engraçado dizerem isso, não é como se o loiro fosse exatamente conhecido pela brutalidade da fala. De todo modo, entrou na sala de interrogatório com um sorriso cansado; interpretaria alguém que virou a noite estudando o caso. E era muito bom nisso. Correu os olhos pelo ambiente, parecendo um tanto desconfortável. Quando se dirigiu a ela, havia certa surpresa em seu semblante.

— Uau, aqui é realmente esquisito. Com uma piscadela, buscou adquirir confiança da moça enquanto puxava uma cadeira próxima. — Se importa?

Fixou o olhar nos papéis, como se procurasse alguma coisa em letras miúdas. Esperava que desta forma a vitima se pronunciasse, mas de toda forma acabou por se apresentar.

— Bom, me chamo Judah! Estendeu a mão, e em algum lugar de sua mente torcia para não ser ignorado. — E a Senhorita é…?

Assentia com a cabeça suavemente conforme a garota contava a sua história, tropeçando nas palavras pelo nervosismo. Fez questão de não interrompê-la em momento algum, temendo que fosse frear seu impulso de dizer tudo o que sabia. E reviver esse momento mais de uma vez seria doloroso demais. Por fim, não sorriu mas manteve o semblante leve.

— Sinto muito por ter que repassar essas imagens horríveis, Shany. Mas seu depoimento será de grande ajuda na busca por quem fez isso. Vou me esforçar para tal, combinado? Se levantou, após anotar mais algumas coisas em sua prancheta. Estava coberto de informações que tinham de ser organizadas para que fizessem sentido a uma segunda pessoa. — Pode ir para casa, trate de descansar está bem?

A mente tem dessas coisas. Shany despejou diversas orientações, mas nem ela que presenciou tudo aquilo era capaz de unir as pontas e criar uma narrativa que fizesse sentido. Não vamos culpa-la, é de fato complicado rever esse tipo de lembranças em um estado tão conturbado quanto o dela.

Procurou então algum canto onde pudesse juntar aquelas informações. A descrição do homem poderia ser de grande ajuda no momento da captura, mas o local ainda era uma incognita. Não agia sozinho, isso era claro. Mas precisava encontrar uma forma de juntar os fragmentos de memória. Veja bem, Judah não é tão inteligente quanto gosta de transparecer. Então esse processo provavelmente levou algum tempo, que nem ele nem eu saberiamos dizer. Enquanto buscava mentalmente lugares com muitas indústrias na região (que poderiam ser a fonte dos ruídos), ansiava para que alguém viesse lhe informar que havia uma nova testemunha ou até que viram o suspeito em algum lugar.

Devia ter prestado mais atenção naquelas aulas de estratégias e raciocínio lógico na Academia.

É. O tempo era realmente uma questão importante a ser levada em consideração. Agora que mais uma garota havia sido raptada havia ainda mais pressão sob nosso Genin que agora rabiscava coisas sem sentido com um lápis, forçando-se a decidir uma rota. Seus olhos corriam entre os três pontos riscados no mapa, mas a possibilidade do erro lhe assombrava.

Decidiu por fim ir pela primeira, a mina de carvão. Sendo subterrânea, isso possivelmente explicaria o porquê dos ruídos estranhos e abafados. Poderia ser a caverna das montanhas, se não fosse o fato da garota ter explicitamente dito que ouviu vozes. Podia estar errado, mas torcia para que tivesse feito a decisão correta. Pelo seu bem e… É, em parte pelo bem da nova vitima. Saindo com certa pressa no andar, traçou a rota até onde o mapa indicava e carregando apenas seus equipamentos básicos; não podia permitir que algo o atrapalhasse em um possível combate.

Na entrada da mina, parou. Apesar de ser muito cedo, não tinha certeza se haveriam civis por ali. Tinha de manter a calma e a aparente normalidade para não despertar suspeitas.

Não demorou muito até descobrir que de fato o turno dos mineiros havia de fato se iniciado. Isso tornava as coisas um tanto… Complicadas. Judah se manteve atrás de uma coluna um pouco antes da entrada para não ser visto enquanto deliberava as opções a serem tomadas. Sua reputação estava em jogo! Ah, e a vida da menina também.

Correu os olhos ao redor em busca de alguma inspiração, que quase por uma intervenção divina veio na forma de duas construções um pouco mais afastadas. Pareciam casas, se você for generoso. De toda forma foi pra lá que o Genin se encaminhou. Com a mão esquerda pousada na abotoadura de sua bolsa de equipamentos, se preparava para o pior.

Tinha como objetivo se aproximou pelo ponto cego das pequenas janelas, ligeiramente curvado para não ser visto tão facilmente. Ao se aproximar da primeira buscaria se posicionar logo abaixo da janela na tentativa de sentir ou ouvir algo vindo de dentro, caso negativo faria o mesmo procedimento na casa seguinte.

Aparentemente os mineiros conseguiam manter aquele lugar minimamente organizado. Era surpreendente, e talvez até devesse ser objeto de estudo ou algo parecido. Mas Judah não tinha exatamente muito tempo disponível, quanto mais demorasse em sua investigação menor era a probabilidade de encontrar a garota bem física ou mentalmente. E com isso, talvez o suspeito pudesse enfim mudar de local. Com uma refém esse processo demoraria muito mais tempo.

Pela distribuição dos móveis concluiu que começaria pela segunda casa, a mais distante. Deveria ser a menos utilizada então teria mais facilidade em entrar e vasculhar sem se preocupar em ser visto. Revirou os colchões em busca de quaisquer rastros que pudessem indicar algum tipo de crime no local. Cordas, armamentos, fluídos. Qualquer coisa podia lhe dar alguma orientação de com o que estava lidando na situação.

Não demorou até ir ao segundo cômodo que mais se assemelhava com um escritório. Haviam alguns documentos que foram analisados superficialmente em busca de nomes envolvidos no caso, ou algo do gênero. Concentrou seu tempo em mudar cada coisa de lugar, na esperança de encontrar algum tipo de entrada. Eis que lhe surge a ideia de uma passagem subterrânea. Afinal, estava lidando com homens que cavam a terra, não? Passou a inspecionar todo o piso da construção, mesmo com o tapete que o protegia.

— Bingo.

Enfim estava ali, puxando a porta que levava ao alçapão. Não tinha outra explicação para a existência do esconderijo, era improvável que fosse algo realmente legalizado. Desceu os degraus com extrema cautela; a mão esquerda dentro da bolsa de equipamentos, as costas coladas junto a parede para evitar golpes surpresa. A caminhada pareceu infinitamente mais longa do que foi, provavelmente culpa da tensão em descobrir o que havia ali.

No meio da escuridão surgia um foco de luz que ficava cada vez maior. Algum tipo de iluminação indicava que estava próximo do fim daquela escadaria enorme, e se deparava com uma sala realmente grande para um esconderijo subterrâneo. Haviam mais algumas portas indicando a presença de mais cômodos, mas o ambiente parecia se assemelhar a aquele descrito por Shany. O que era um grande avanço.

Com passos milimetricamente pensados se aproximou da primeira porta, da qual alguns ruídos eram emitidos. E lá estava o nosso homem. E a garota, na verdade. Ela estava no chão, amarrada e indefesa. Ele estava de costas para a saída, preparando algo que a baixa luminosidade não permitia descobrir o que era. Mas Judah sabia agir, ou ao menos pensava saber.

Ligeiramente curvado, a mão que estava entre suas armas sacou duas kunais que agora eram direcionadas a parte de trás dos joelhos daquele homem. O movimento seria seguido por alguns selos que criariam dois clones meramente ilusórios. Unindo-se aos seus iguais o Genin saltaria por cima da garota e com uma sequencia de movimentos buscava esconder sua verdadeira posição entre os Bunshins para desferir um soco na altura do estômago.

Surpreendentemente o homem era incapaz de distinguir os clones, que não passavam de meras ilusões. Quando o agressor girou os calcanhares para atacar uma das cópias, Judah viu sua oportunidade. Em um único movimento se lançou ao chão para alcançar as duas kunais lançadas anteriormente e novamente as disparou contra as pernas de seu alvo. Porém, imaginando que este saltaria para escapar dos projéteis, preparou um chute de baixo para cima que se fosse efetivo causaria sem dúvidas grande estrago. A fumaça provocada pela destruição de um dos Bunshins agravaria a situação.

— Se renda de uma vez e poupe a sua vida!

O fim veio de súbito, como de costume. Em um momento estava no chão, pronto para dar um chute no sequestrador quando este ergueu as mãos para o alto.

— Está bem! Eu me rendo. O semblante de dor confirmava suas palavras. Nem ao menos era capaz de se erguer tendo ambas as pernas laceradas pelas kunais. Judah o encarou, os olhos completamente neutros. Vazios. Opacos.

— Não se mova. Passou por cima do homem e com uma das lâminas rasgou as cordas que prendiam a, agora ainda mais assustada, vítima. Com os olhos marejados, murmurou agradecimentos ao Genin que apenas sorriu e a ajudou a levantar. Usou a corda que antes atava os braços da garota para imobilizar o agressor.

Se o menor pudor o fez caminhar até o prédio policial mesmo com os membros machucados. Não havia a menor pressa, na verdade. Até fez algumas pausas quando via que o homem realmente não se aguentava em pé. A jovem uma vez livre foi na frente para prestar esclarecimentos e ser liberada o mais rápido possível.